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“Como o Governo pretende reduzir gastos com INSS e enfrentar o dilema dos gastos obrigatórios”

O aumento das discussões em torno da meta de resultado primário para os próximos anos, pouco antes do envio do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acabou deixando em segundo plano o debate sobre outra parte importante da política fiscal.

Além de definir compromissos para a relação entre receitas e despesas, o novo arcabouço fiscal também estabeleceu uma regra específica para o crescimento das despesas públicas ao longo dos anos – o que já tem gerado problemas no mundo político e chamado a atenção do mercado financeiro.

Segundo essa norma, as despesas devem aumentar em uma proporção de 70% em relação ao crescimento das receitas do ano anterior, respeitando um intervalo de avanço real (descontada a inflação) entre 0,6% e 2,5%. E caso o resultado primário do ano anterior tenha ficado abaixo de uma faixa de tolerância de 0,25 ponto percentual em relação à meta estabelecida, o fator de ajuste cai para 50%, reduzindo as despesas permitidas e afetando a série histórica para o futuro.

Apesar de ser uma regra mais branda que a anterior (que limitava o crescimento das despesas à inflação acumulada no ano anterior), membros da equipe econômica do governo já preveem uma discussão futura sobre o comportamento das despesas obrigatórias, que representam cerca de 91% do Orçamento de 2024 – e tendem a crescer ainda mais caso nada seja feito.

O secretário-executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento, Gustavo Guimarães, destacou em entrevista ao InfoMoney que a equipe econômica tem trabalhado para revisar as despesas previstas, principalmente nas grandes rubricas orçamentárias, que estão concentradas nas despesas obrigatórias. No entanto, ele ressaltou que isso não exclui a necessidade de um debate estrutural para garantir a sustentabilidade da política fiscal no futuro.

O governo espera economizar cerca de R$ 10,9 bilhões apenas com a revisão dos gastos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) neste ano. Isso não impediu uma revisão para cima no montante previsto para gastos com benefícios previdenciários, mas ajudou a reduzir a necessidade de bloqueio orçamentário em março, que ficou em R$ 2,9 bilhões – justamente para cumprir a regra de limite de despesas estabelecida pelo novo arcabouço fiscal.

Deste total, cerca de R$ 5,6 bilhões são esperados com ganhos de eficiência no uso da tecnologia para análise de documentação (Atestmed) na concessão de benefícios por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença). Segundo Guimarães, a ideia é que o sistema esteja em pleno funcionamento a partir de maio, após um período de coexistência com avaliações periciais tradicionais para um comparativo de resultados e riscos de fraudes. A expectativa é que os ganhos de eficiência compensem eventuais problemas com fraudes.

O secretário ressalta que a nova tecnologia tem ajudado a reduzir as filas do INSS, mas também aumentou a procura no curto prazo e gerou maior pressão sobre as despesas do governo. Ele compara a situação com o mercado de trabalho: quando está aquecido, há contratações e o desemprego demora a cair, pois as pessoas que estavam fora da força de trabalho entram em busca de emprego.

Guimarães destaca que o uso de tecnologia para ganho de eficiência também deve ser aplicado em outras áreas do serviço público, como na gestão de precatórios. A ideia é fazer parcerias com o Poder Judiciário para compartilhar informações sobre processos e identificar padrões em decisões desfavoráveis à União – o que pode ajudar a definir estratégias administrativas e até mudanças na legislação, além de, no longo prazo, potencialmente reduzir as derrotas do governo na Justiça.

“A revisão de despesas é ainda mais importante agora. Se não fizermos uma revisão nas despesas obrigatórias, não teremos espaço para as discricionárias. No limite, se nada for feito, com as receitas crescendo, essas despesas obrigatórias vão aumentar e chegaremos em um ponto em que só teremos despesas obrigatórias”, alertou o secretário.

Ele também ressalta que a trajetória dos gastos públicos é importante para o mercado, pois oferece previsibilidade sobre o crescimento das despesas. No entanto, ele pontua que manter todas as despesas contidas no limite exigirá uma discussão sobre a composição das mesmas. Caso contrário, voltaremos à situação anterior, com as despesas obrigatórias crescendo e cada vez menos espaço para as discricionárias – o que aconteceu com o bloqueio orçamentário recente.

Em regras de limitação de despesas públicas, como o antigo teto de gastos (mais rígido) e o novo marco fiscal, quando uma rubrica de despesas ultrapassa o limite permitido, outras (discricionárias) precisam ser sacrificadas para compensar o efeito geral. Isso normalmente acontece com gastos obrigatórios, que o gestor público não pode escolher se paga ou não. É o caso dos benefícios previdenciários, que representam 42% do total de despesas previstas no Orçamento de 2024 e acompanham variáveis como o salário mínimo, que voltou a ser corrigido acima da inflação.

Apesar do nome, as despesas discricionárias também são importantes para a manutenção da máquina pública e a garantia de políticas públicas estratégicas para o país. Especialistas em contas públicas estimam que um mínimo de R$ 80 bilhões a R$ 90 bilhões devem ser reservados para essas rubricas para garantir o funcionamento mínimo do Estado e evitar um possível “shutdown”. Isso significa que, em algum momento, a pressão sobre as despesas discricionárias exigirá uma discussão sobre a evolução das despesas obrigatórias.

Para Guimarães, que também coordena o Grupo de Trabalho de Revisão de Gastos Federais, o “spending review” em andamento é fundamental para trazer racionalidade ao processo orçamentário e à execução de políticas públicas. Ele acredita que esse debate deve ser incorporado permanentemente no cenário político brasileiro, mas com cuidado para não gerar soluções temporárias que trarão custos adicionais no futuro. O secretário reitera que esse instrumento apenas adia o debate necessário sobre o tamanho das despesas obrigatórias e suas vinculações.

“Precisamos começar a pensar se todas essas vinculações fazem sentido”, diz Guimarães. Além das vinculações dos benefícios previdenciários ao salário mínimo, o governo é obrigado a destinar pelo menos 15% da receita corrente líquida para a saúde e 18% da receita de impostos para a educação – regras que foram recuperadas

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